terça-feira, 31 de julho de 2007

segunda-feira, 30 de julho de 2007

Pequenas coisas de acordar


Falar do trigo e não dizer

o joio.

Percorrer em voo raso os campos

sem pousar

os pés no chão.

Abrir um fruto e sentir

no ar o cheiro a alfazema.

Pequenas coisas,

dirás, que nada

significam perante

esta outra, maior: dizer

o indizível. Ou esta:

entrar sem bússola

na floresta e não perder

o rumo. Ou essa outra, maior

que todas e cujo

nome por precaução

omites. Que é preciso,

às vezes,

não acordar o silêncio.


Albano Martins

sábado, 28 de julho de 2007

Voltarei?

"Quando eu morrer voltarei para buscar
os instantes que não vivi junto do mar"

Sophia de Mello Breyner

Mas como, Sophia, se mesmo em vida não cheguei a partir e me falta tudo em volta, a mãe a contar-nos com os olhos - um, dois, três, quatro, cinco - e de manhã os queques quentinhos da Sra. Gama - um, dois, três, quatro, cinco - e na praia as Bolas de Berlim em caixa de folha de lata e sempre - um - a areia a cair - sem querer - dois, três, quatro, cinco - em guerra. Ainda bem o senhor António com olhos muito azuis que se esquece de ralhar comigo e tira picos de ouriços de pés de outros meninos que chegam num ápice vindos do futuro. Não sei como desapareceram os bolos com creme a escorrer nas toalhas, levaram com eles os pregos e os baldes, e sobraram - um, dois, três, quatro, cinco - pessoas crescidas a tomar café e a ler o DN na esplanada. Salvaram-se os pés cheios de areia e as algas despentadas pela maré, lua cheia, maré vaza, regresso agora dos instantes, não quero morrer, procurei-os nas pocinhas salgadas de búzios coloridos, tenho sal no corpo e nos olhos, as gaivotas aterraram e são horas de viver mais. Jantaremos penteadinhos de cabelo a escorrer, não sei porquê tantas crianças parecidas connosco, voltaremos em vida a nós mesmos? Até amanhã, senhor António. Voltarei.

terça-feira, 24 de julho de 2007

Notícias da Biosfera!

Um blogger, por sinal fantástico, por sinal adorado por esta cidadã, e cujo pudor me leva a manter anónimo, acaba de se licenciar em Bioquímica... Nem sempre as notícias são más, nem sempre as lágrimas eternas, nem sempre os percursos intermináveis, quando muito cansativos, pesados, arrastados, esforçados. Nada como sorrir em conjunto e dar os parabéns a quem merece. É muito difícil ser o Pyny da forma que é o Pyny, cujo ADN partilho mas não sei desenhar.

O Pyny é um homem convicto das suas ideias e respeitador das dos outros. Assume os seus caminhos sem vergonha de mudar de oriente quando a coerência está com ele. Trabalha sem medo, é humilde (a mais difícil forma de inteligência) e generoso, leal e afectivo. Tem os segundos olhos mais bonitos da blogosfera portuguesa. E a gargalhada que dá mais esperança no mundo inteiro, dando fé a que as gerações nunca se separem mas se unam nas suas causas e nos seus desejos profundos de construir um mundo sempre melhor para todos.

Feliz, feliz, feliz, por escrever coisas boas e saborosas, vitórias muito bem trabalhadas e conquistadas de quem sabe o que quer na vida e caminha pelos seus passos com persistência e convicção. Aguardam-se iogurtes de novos sabores, certamente mais humanos, com bio-abraços em dívida e bio-conversas para pôr em dia. Parabéns, Pyny!

domingo, 15 de julho de 2007

Salpicos


Podem vir de mergulhos toscos embrulhados em coragem e de pézinhos frios, sacudidos ao colo, embrulhados em toalhas de gargalhadas e braços seguros pela fragilidade e pureza de quem se transporta, chinelinhos de plástico coloridos esquecidos pela relva como pincéis que dormem. Também salpicos de lágrimas, dói-dóis que passam com beijos - as vespas não gostam de brincar e ninguém sabe porquê e matrecos só com bolas que não caibam na baliza para nunca ninguém perder, mesmo quando somos todos do Benfica. Os beijos, claro, lambuzados de chocolate e os legumes precisam sempre de ajuda e batota para saírem todos do prato, em salpicos de boa vontade, para o prato de qualquer tia vegetariana que se preze. Salpicam-se os abraços - bons demais - com tinta de sorrisos e o amor escondido ou envergonhado ou temeroso (são tantas as cores do amor) salta quando menos se espera, enquanto os caracóis sobem as paredes mais depressa que os anos a passar.

Cuidemos das nossas crianças, dos nossos professores de vida, dos nossos sorrisos, dos nossos companheiros de armas mais persistentes, dos nossos idealistas mais puros. A revolução terá que passar por aqui: combater os maus-tratos, denunciar os abusos, ser implacáveis com o desleixo e o abandono, cultivar sempre e muito o amor. Partilhar com eles as nossas dúvidas e escutar com seriedade as respostas. Não são extraterrestres nem habitantes dos solos, são gente e partilham o mundo connosco, são cidadãos de pleno direito, só mais frágeis fisicamente e talvez nas emoções por andarem há menos tempo na estrada. Salpicos de um mar de humanidade cheio de vida e vezes a mais com amor em déficit, merecem tudo, igualdade de oportunidades começa por ali, pelo início. Na direcção que quiserem escolher, sempre, com um sorriso.
-
P.S. - Nas passadas duas semanas tive contacto de perto com situações de maus tratos infantis. Só encontro uma explicação para semelhantes situações: doença psiquiátrica grave dos adultos que os praticam e que devem ser imediatamente internados ou maldade que requer extradição da raça humana... Lembro por isso os seguintes recursos: APAV e SOS Criança.

sexta-feira, 13 de julho de 2007

Madrugada

Triste e leda ...

Em que acordei cedo demais e encontrei a vida ainda a dormir para sempre, o mundo frio, os passos na noite, todos os que se tinham ido embora, inconsciente do sol que procuraria e as palavras não são as minhas.

Não sei o que será acordar, provavelmente ser gente e sorrir e ter um ladinho dormente no coração que nos impeça e defenda de pensar em pessoas que sofrem, em muros que se erguem, em barreiras que nos separam.

Talvez ter uma vida normal e precipitarmo-nos para a mais estúpida das rotinas, embarcar num carreiro sem terra nem água e iguais a todos percorrer o dia para o acabar satisfeitos com o que demos à humanidade quando nem a nós nada demos. Nunca damos o suficiente.

Provavelmente o cansaço ganha-nos, não procuramos nem lutamos nem esperamos como devíamos e um dia algo nos sacode e nos tira a vontade de acordar, melhor não dormir em serviço, que fazemos parte de um grupo e de uma vontade maior que a de um só, dois ou três - o infinito - já um ideal quando a força de caminhar no frio não leva a lado nenhum a não ser talvez a nós mesmos mas caminhamos no entanto.

Sem sorrisos ou com tudo junto no peito e os pés em sangue mas caminhemos.

domingo, 8 de julho de 2007

13

"Understand I'll stay
With you every day.
Make you love me more
In every way.
So if you want me
Just like I want you.
You know what to do.
Just call on me..."


imagem: Jim Borgman
letra: Beatles

sábado, 7 de julho de 2007

Grocando

"Mike permaneceu em transe;
havia muito para grocar,
pedaços soltos para serem reunidos
e incluídos no
seu crescimento:
tudo o que ele havia visto, ouvido e sido."

-

Um Estranho Numa Terra Estranha



Robert A. Heinlein faria hoje 100 anos. Dos mais notáveis escritores de ficção científica de projecção que já li, continua a ser uma das minhas referências, escrita atemporal, imaginação notável, simulações assustadoras pela actualidade permanente e leitura singular da mente humana. Também pela observação atenta das relações entre indivíduos: "Political tags are never basic criteria. The human race divides politically into those who want people to be controlled and those who have no such desire. War has never solved anything". Paz, liberdade política, ideológica, sexual, religiosa... basicamente, um anarquista em luta pela coexistência respeitosa da sua raça e que gostava de escrever. Agrada-me demais.

Não tenho pertinência para comentar o seu génio. Apenas agradeço o trabalho que nos deixou. Quem não conhece ainda, leia. Quem já leu, não precisa certamente de sugestão para reler. É demasiado irresistível.

terça-feira, 3 de julho de 2007

Depressa

Na estrada de terra amarela sentiam-se ainda os pés compactos dos soldados que não teriam talvez passado, o pó levantava pelo caminho árido e sempre na direcção de uma fuga sem destino, caminhante em pânico pelo que atrás ficava e pelo que se não via, que o pó, sempre o pó, fazia chorar e levantava mais se se abrandava, acelerar porquê, se as rodas, basta o que girava até ficar sem sentidos numa direcção qualquer que nunca é a escolhida mas sempre fora do lugar onde. À frente laranjas como num lago gelado, frias e vivas, formosas, brancas por dentro, saborear tudo até ao fim, em movimento, na fuga ainda, não fosse alguém acordar e porque não sabiam as pessoas que as laranjas eram ali tão dentro de nós e tão madrugadoras, caindo em mãos ávidas de sabor amargo como tudo o que acabou de nascer e quer que acabe o medo de morrer que vem pegado. Para trás o nada, campos verdes depois, sem rumo, caminhos abertos, sem pó, o sol que levantava e pintava o céu e cegava o rumo que de qualquer forma não era para ver, ainda não é, ainda bem o sol e o azul. As águas paradas. Os sons que o vento faz quando dorme nos ramos e na superfície das doces águas, embaladas, inconscientes, para se perderem os pensamentos nelas. As pessoas crescidas dormem até tarde ou fazem bebés. De triciclo não se vai muito longe, talvez só até à inconsciência e ao torpor de uma liberdade que quer ser agarrada de uma só vez pelas mãos de um édipo qualquer que abrace forte e não faça muitas perguntas. No sótão, sempre, dorme a garagem azul, de madeira clareada pelos risos, com o pó a jazer lá dentro, as esperanças envelhecem ou somos nós que crescemos. Talvez haja uma garagem azul nalgum ponto do meu percurso. Cansa andar de triciclo e mesmo quem não tem coragem para parar precisa de um porto de abrigo, talvez para sempre, talvez no fim da estrada de terra batida, olhos fechados no pó. O mundo não vale assim tanto a pena, melhor continuar a pedalar, melhor esperar pelo portão que se abre e redimensiona a vontade de ser preso pelos soldados que assustam e calcam sempre a estrada onde ao longe os cães coxos uivam por carinho.

segunda-feira, 2 de julho de 2007

Heavens!


E não é que tinha mesmo?

  • é bom ser mulher (obrigado Alien)


Hoje, a lua cheia alimenta ideais e convicções, Julho já se respira como mês doce que é, entre a calma do calor e o cheiro a mar que dá vida. Fases mais complicadas e mais sobrecarregadas se têm sobreposto a um exercício de escrita que cultivo e a leituras que procuro enquanto meio privilegiado de informação e afecto. Regressa o stress pós-stress, o gosto de um trabalho terminado, sempre ponto de partida para novos saltos. I'm in heaven! Boa noite, bom dia, que bom é poder sorrir com vontade quando nos sentimos vivos...