quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Na proporção exacta...

Chá de limão e gengibre, chuva torrencial, calor humano e uma árvore de Natal. Um bebé no colo, um bebé a sorrir. Um bule com bonecos e um quadro com giz para escrever tantas coisas importantes que só cabem num quadro seguro por um coelho do País das Maravilhas. Coisas importantes...

A viagem foi perigosa, as viagens de regresso do País das Maravilhas são sempre assim, assustadoras, como um filme em 3D, a chuva teima ainda em entrar pelo meu quadro dentro e apagar a lista que o coelho insiste em fazer.

Coisas importantes: ter um abrigo e mais ainda um colo.

Coisas importantes: ter amor e mais ainda, ou igualmente, amigos.

Coisas importantes: sentir o paraíso num sabor novo, em dias velhos, em locais familiares, sentir que as coisas verdadeiramente importantes como o quente de um bebé no colo e o sorriso verdadeiro que abre o futuro por sobre a chuva e por sobre o medo que os crescidos têm a mania de ter.

Fundamental é mesmo o amor.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Um conto de Natal

Num dia intenso em que o frio se fez sentir mais por fora do casaco que no coração e a chuva lembrou um pizzicato infantil tocado em ginásio de escola, tive o privilégio de estar com muitas pessoas que amo. Quase todas.

Nunca estamos com todas as pessoas que amamos. E o Natal é uma época estranha e melancólica, se fosse música seria meio Requiem meio Rock. Em palavras, procurei Novelas do Minho e reencontrei um belo texto que fala de inocência e ausência, signos que deixaram, talvez, de fazer sentido para quem optou pela via do grande consumo.

Por outro lado, o facto de aderir a uma festa que é religiosa por origem e solidária por civilidade, não significa necessariamente que o mundo esteja cheio de Scrooges sem noção do Natal Futuro e sem consciência dos verdadeiros heroísmos do amor.

Hoje tive tempo para muitas pessoas que eu amo. Hoje fui mimada e privilegiada de forma invulgar por pessoas invulgares, quer por via electrónica, quer por telefone, quer pessoalmente (nada como o colo de um irmão para nos fazer sentir adoçados e preenchidos por muito que a vida nos vá tirando presenças em cada ano que passa).

Hoje foi igualmente um dia especial para um amigo. Como amanhã vai ser um dia especial para outro. Porque o Charles Dickens que eu responsabilizava em criança pelas misérias publicitadas de uma Londres industrializada também era o que escrevia diálogos de conciliação. Porque numa guerra nunca morrem milhares de pessoas. Porque nunca se deve generalizar. Porque nunca se deve dizer nunca, como acabei de fazer. Porque queria agora as gotas de chuva na cara, as da hora do almoço, a caminho de casa dos meus pais, que caminham há muito mais tempo que eu e que já perceberam muito melhor que esta história de festas de final de ano são apenas constatações de paragens de comboios em plataformas alucinantes em que ganhamos e perdemos companhias preciosas. Por vezes, companhias de um dia só.

Tenho sono e parece que já começou o dia seguinte. As gotas de chuva voltarão a adoçar o sal que me toca raramente. Só naqueles dias em que a consciência das ausências dos que gostaria de mimar e não posso é mais profunda. As gotas de chuva voltarão. E trarão com elas, certamente, como desde o princípio do mundo, um arco-íris.