Foi quando comecei o meu blog. Acabo de o reler na íntegra e, como tal, reler dez anos da minha vida. Acompanhou-me quando trabalhava nas minhas duas teses, quando não tinha sono e me preocupava, quando o mundo funcionava mal e agora não funciona muito melhor, afinal. Foi o meu afago no ombro quando as coisas corriam menos mal, quando a vida parecia tomar rumos que me apeteciam. E afinal os rumos já estavam todos decididos e eram outros por muito que eu gritasse e gritei bastante. Quando não estava a olhar iam-me tirando pessoas, outras partiam, outras nunca chegaram, realmente, a estar.
Com que se fica, de dez anos de escrita pública? Com um sabor a incógnito, com um dever de me reexplicar o que aconteceu em todos os dias de escrita, por que foram aquelas as palavras tomadas e não outras, porque foram aqueles os sorrisos ou as lágrimas ou o medo. Tudo o que faz uma década, soubesse eu em fevereiro de 2005 o que sei hoje e não teria escrito uma linha, teria aproveitado o tempo de outra forma, teria guardado dentro de mim, egoísta, tudo o que vivi, teria apanhado cada segundo com uma rede e escondido tudo de todos para que nada faltasse dez anos depois.
Claro que o sol é o mesmo e hoje o céu está azul. Acabarei agora a minha escrita? Faço 50 anos daqui a semanas. A frase que me ocorre é a que já não tenho idade para estas coisas. Já enfrentei a vida vezes a mais, umas vezes ganhei, outras perdi. Estou enfraquecida, frágil, quebrada. Ao mesmo tempo tenho tantas coisas pelas quais posso e devo dar graças.
As memórias, essas, passeiam por mim de vez em quando, quase todos os dias, umas aquecem, outras nem por isso. Mas acompanham o ritmo de uns passos cada vez mais medrosos, cada vez mais curtos. Tantas palavras por dizer e escrever. Vou beber um chá e pegar no meu livro. Tenho 49 anos e chamo-me Maria. Tive um blog.