"A neve pôs uma toalha calada na mesa de tudo."
Alberto Caeiro
Alfred Stieglitz, Winter on Fifth Avenue, New York, 1893
1893 / print ca. 1924-1934 gelatin silver print 6.4 x 7.3 cm.
"Um título é parte integral de uma história. Porque não? No fim de tudo, a vida não é uma resposta. restam ambiguidades. Resta o espaço para a dúvida." Isaac Asimov, Mensagens do Futuro.
quinta-feira, 29 de dezembro de 2005
terça-feira, 27 de dezembro de 2005
Uma visão diferente do mundo
Tenho muitos amigos e colegas cegos. Alguns nasceram assim, nunca viram. Outros, cegaram em crianças e têm uma vaga memória de cores, noções de longe, de horizonte, de rostos. Outros ainda cegaram já em adultos. Percursos difíceis, sobretudo no último caso, porque requerem uma adaptação muito radical à forma de abordar o mundo como o conhecemos.
Ninguém é melhor nem pior por ter mais ou menos um sentido. Como em todas as situações, as pessoas valem sempre por si e não pelos seus condicionalismos ou características. De qualquer forma, muito tenho aprendido, sobretudo no que toca a reacções positivas, a coragem, a capacidade de refazer completamente estruturas de vida, sobre generosidade, sobre relativizar o que apelidamos de problemas.
Muito tenho também aprendido sobre formas de comunicação diferentes e sobre formas de conceptualizar o mundo. Normalmente associa-se a cegueira a uma capacidade inata de orientação, de ouvido, de sensibilidade, de paciência. Em muitos casos, sim, desenvolvem-se essas características.
Mas o que mais me tem marcado é a capacidade de lidar com um tempo diferente. A humanidade. A paciência. Tenho tido muita sorte com os amigos que tenho conhecido nos últimos tempos, excelentes pessoas, fantásticos profissionais, trabalhadores incansáveis.
Hoje encontrei um caso de falta de esperança, de muita revolta, que estranhei. Para mim, não ver está associado a alguma dependência, sim, sobretudo pela questão das deslocações menos autónomas, pelos problemas de mobiliário urbano mal colocado, pela espera de ajudas técnicas que muitas vezes se arrastam e pela incompreensão e incredulidade da maior parte das pessoas quanto à competência e possibilidades de um cego estar integrado na vida social, profissional, académica, afectiva, como qualquer outra pessoa.
Estudo este tema actualmente e muito grata estou pela aproximação que todos estes amigos me têm ajudado a fazer a conceitos que me eram desconhecidos. E também pela riqueza que trouxeram à minha vida e à do meu filho, que já vai crescer dentro de uma abertura de espírito pouco comum nas crianças da sua idade.
A constituição portugesa consagra a igualdade, mas os homens só escrevem as leis. O horizonte é mais curto para quem vê, em muitos casos.
Quanto a mim, tudo o que tenho descoberto é uma dimensão diferente de lidar com o que nos é próximo. E amigos, muitos amigos, muitas pessoas generosas e sábias, dispostas a expôr as suas experiências para que quem está longe se aproxime. Talvez o horizonte esteja mesmo na ponta dos nossos dedos e dos nossos corações.
Ninguém é melhor nem pior por ter mais ou menos um sentido. Como em todas as situações, as pessoas valem sempre por si e não pelos seus condicionalismos ou características. De qualquer forma, muito tenho aprendido, sobretudo no que toca a reacções positivas, a coragem, a capacidade de refazer completamente estruturas de vida, sobre generosidade, sobre relativizar o que apelidamos de problemas.
Muito tenho também aprendido sobre formas de comunicação diferentes e sobre formas de conceptualizar o mundo. Normalmente associa-se a cegueira a uma capacidade inata de orientação, de ouvido, de sensibilidade, de paciência. Em muitos casos, sim, desenvolvem-se essas características.
Mas o que mais me tem marcado é a capacidade de lidar com um tempo diferente. A humanidade. A paciência. Tenho tido muita sorte com os amigos que tenho conhecido nos últimos tempos, excelentes pessoas, fantásticos profissionais, trabalhadores incansáveis.
Hoje encontrei um caso de falta de esperança, de muita revolta, que estranhei. Para mim, não ver está associado a alguma dependência, sim, sobretudo pela questão das deslocações menos autónomas, pelos problemas de mobiliário urbano mal colocado, pela espera de ajudas técnicas que muitas vezes se arrastam e pela incompreensão e incredulidade da maior parte das pessoas quanto à competência e possibilidades de um cego estar integrado na vida social, profissional, académica, afectiva, como qualquer outra pessoa.
Estudo este tema actualmente e muito grata estou pela aproximação que todos estes amigos me têm ajudado a fazer a conceitos que me eram desconhecidos. E também pela riqueza que trouxeram à minha vida e à do meu filho, que já vai crescer dentro de uma abertura de espírito pouco comum nas crianças da sua idade.
A constituição portugesa consagra a igualdade, mas os homens só escrevem as leis. O horizonte é mais curto para quem vê, em muitos casos.
Quanto a mim, tudo o que tenho descoberto é uma dimensão diferente de lidar com o que nos é próximo. E amigos, muitos amigos, muitas pessoas generosas e sábias, dispostas a expôr as suas experiências para que quem está longe se aproxime. Talvez o horizonte esteja mesmo na ponta dos nossos dedos e dos nossos corações.
segunda-feira, 26 de dezembro de 2005
O beijo
Poema de Natal
"Para isso fomos feitos:
Para lembrar e ser lembrados
Para chorar e fazer chorar
Para enterrar os nossos mortos -
Por isso temos braços longos para os adeuses
Mãos para colher o que foi dado
Dedos para cavar a terra.
Assim será a nossa vida
Uma tarde sempre a esquecer
Uma estrela a se apagar na treva
Um caminho entre dois túmulos -
Por isso precisamos velar
Falar baixo, pisar leve, ver
A noite dormir em silêncio.
Não há muito que dizer:
Uma canção sobre um berço
Um verso, talvez, de amor."
Para lembrar e ser lembrados
Para chorar e fazer chorar
Para enterrar os nossos mortos -
Por isso temos braços longos para os adeuses
Mãos para colher o que foi dado
Dedos para cavar a terra.
Assim será a nossa vida
Uma tarde sempre a esquecer
Uma estrela a se apagar na treva
Um caminho entre dois túmulos -
Por isso precisamos velar
Falar baixo, pisar leve, ver
A noite dormir em silêncio.
Não há muito que dizer:
Uma canção sobre um berço
Um verso, talvez, de amor."
Vinicus de Moraes, O Operário em Construção
segunda-feira, 12 de dezembro de 2005
Landscape with dead tree
Charles F. Snow (1886-1964): Untitled (Landscape with Dead Tree)
Toned silver print, 3.25 x 4.25 inches
Aniversário
"O tempo em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu era feliz e ninguém estava morto.
Na casa antiga, até eu fazer anos era uma tradição de há séculos.
E a alegria de todos, e a minha, estava certa, como uma religião qualquer."
Eu era feliz e ninguém estava morto.
Na casa antiga, até eu fazer anos era uma tradição de há séculos.
E a alegria de todos, e a minha, estava certa, como uma religião qualquer."
Álvaro de Campos
sexta-feira, 2 de dezembro de 2005
Natal
Tem muito de recordações, é muito físico. Natal são cheiros de infância, filhoses, chocolate quente feito pela Mãe. Esperar a meia-noite para abrir o presente do Pai Natal ou do Menino Jesus (nunca percebi bem este consórcio, mas sempre foi agradável...).
Natal são músicas que arrepiam porque puxam as nossas emoções e recordações mais ternurentas ou mais dolorosas.
Assisti na quarta-feira a um concerto de Natal, em São Roque, com um coro infantil fantástico, com uma execução muito boa da 1ª suite para violino de Bach. O Largo da Misericórdia estava cheio, a Igreja de S. Roque (quem não conhece não vai para o céu... é lindíssima) cheia estava.
As palmas impuseram uma última música, preparada - noblesse oblige - pelas crianças. Adeste Fidelis encheu de harmonia e de lágrimas grandes e pequenos. Bebés assistiam ao concerto e dançavam graciosamente pela igreja fora. Desmistifiquemos a relação com as igrejas, por favor.
Espaços que se querem de liberdade, o concerto podia ter sido numa mesquita? Não sei. Cada religião tem as suas regras e por norma respeito-as. Mas a verdade é que as igrejas católicas são cada vez mais locais públicos de oração, de reflexão e de cultura. São de todos e são de livre acesso. Porquê tanto drama com os crucifixos nas escolas, agora? Porquê politizar o que pode ser uma referência, mas pode ser apenas um quadro como qualquer outro. A educação religiosa não é obrigatória. Conhecer os princípios de uma ou mais religiões ou explicar porque não se seguem é importante porque não se pode ignorar o passado. Já outros princípios, mais institucionais, não me parecem de bom senso...
De qualquer forma, o espaço igreja não contamina ideologicamente e podem ir à vontade ouvir e ver os concertos a S. Roque. Também os crucifixos nas igrejas só assustam quem tem medo que a História se repita, algo que, de facto, já percebemos que só acontece, como o Natal... quando um Homem quiser.
Reservemos as nossas preocupações para se as escolas têm telhados em condições, aquecimento central, alimentos suficiente para o corpo e para o espírito e cumprem a sua missão junto das crianças que as frequentam.
É Natal, seja lá como se o encara, mas vamos pensar um pouquinho para fora de nós, por favor.
Natal são músicas que arrepiam porque puxam as nossas emoções e recordações mais ternurentas ou mais dolorosas.
Assisti na quarta-feira a um concerto de Natal, em São Roque, com um coro infantil fantástico, com uma execução muito boa da 1ª suite para violino de Bach. O Largo da Misericórdia estava cheio, a Igreja de S. Roque (quem não conhece não vai para o céu... é lindíssima) cheia estava.
As palmas impuseram uma última música, preparada - noblesse oblige - pelas crianças. Adeste Fidelis encheu de harmonia e de lágrimas grandes e pequenos. Bebés assistiam ao concerto e dançavam graciosamente pela igreja fora. Desmistifiquemos a relação com as igrejas, por favor.
Espaços que se querem de liberdade, o concerto podia ter sido numa mesquita? Não sei. Cada religião tem as suas regras e por norma respeito-as. Mas a verdade é que as igrejas católicas são cada vez mais locais públicos de oração, de reflexão e de cultura. São de todos e são de livre acesso. Porquê tanto drama com os crucifixos nas escolas, agora? Porquê politizar o que pode ser uma referência, mas pode ser apenas um quadro como qualquer outro. A educação religiosa não é obrigatória. Conhecer os princípios de uma ou mais religiões ou explicar porque não se seguem é importante porque não se pode ignorar o passado. Já outros princípios, mais institucionais, não me parecem de bom senso...
De qualquer forma, o espaço igreja não contamina ideologicamente e podem ir à vontade ouvir e ver os concertos a S. Roque. Também os crucifixos nas igrejas só assustam quem tem medo que a História se repita, algo que, de facto, já percebemos que só acontece, como o Natal... quando um Homem quiser.
Reservemos as nossas preocupações para se as escolas têm telhados em condições, aquecimento central, alimentos suficiente para o corpo e para o espírito e cumprem a sua missão junto das crianças que as frequentam.
É Natal, seja lá como se o encara, mas vamos pensar um pouquinho para fora de nós, por favor.
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