sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

Caminhos sem migalhas


Esquecemo-nos por aí. Então perdemos o rasto de nós. Pensamos em coisas grandes, marcamos fronteiras, criamos e desfazemos países, amizades, equipas, identidades, partimo-nos em vez de nos partilharmos. Não me parece que os homens sobrevivam sós - passe o tom bíblico da reflexão.

Cultivar (os nossos jardins, as nossas memórias). Valorizar (o que é tão pequeno que importa mesmo cuidar com muito carinho porque é mais sensível e mais frágil e se nos distraímos se estraga e destrói facilmente, não por ser menor, mas por ser um maior que só é forte quando o pensamos).

Transportamos em nós as coisas importantes. Como as histórias que nos contaram em pequenos, a música dos chuviscos nas janelas dos quartos, os bonecos abraçados na cumplicidade tímida do escuro, o cheiro dos livros de histórias cheios de mãos de crianças a dobrar as folhas, o frio das manhãs de escola, a paz dos sonos infantis em que se sorri.

Será suficiente? Continuamos a fazer guerras e a ser ambiciosos demais, preocupamo-nos com a Cultura como se fosse uma senhora muito importante e descuramos a cultura menos óbvia e menos auto-sustentada - como dizem as pessoas crescidas (a cultura não precisa de sustento, existe, façam as pessoas o que fizerem para a estragar). Perdemos os valores como peças de lego ou cromos, não arrepiando caminho para os recuperar, perdemos até o tempo, que obrigamos a caminhar depressa demais, o tempo, a nossa desculpa para não darmos o nosso melhor, o tempo, a nossa fuga, o nosso alibi, para, no limite, não sermos felizes.

Pequenas coisas a não perder... Estar atento. Aprender com humildade. Agir com convicção. Amar completos. Nunca perder o que (e quem) nos construíu até agora mesmo (neste minuto). Respeitar (muito, todos). Cultivar a paz. Trabalhar. Construir e construir de novo. Recomeçar as vezes que forem precisas, aprendizes impacientes em carreiras de Job, o caminho é longo. Acordar todos os dias no ponto de partida. E nunca nos sentirmos derrotados.

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