domingo, 9 de novembro de 2008

Ainda não

ainda não há nada no pulmão direito
ainda não se respira como devia ser
ainda não é por isso que choramos às vezes
e que outras somos heróis a valer

António José Forte


Crianças que vão para a escola com sapatos três números acima do pézito, que vivem em bairros onde as rixas se resolvem à pancada, que têm mães analfabetas e dependentes de comida dada por vizinhos. Meninos que não sabem dizer o nome e contam histórias com brilho nos olhos e mãos que dançam. Professores que os acolhem, que os ensinam a tocar na carinha e sentir o "m" e o "p" e a repetir, tantas vezes que é preciso repetir. Pais que remendam as calças de uns filhos para os outros e fazem flores e casinhas com restos de tecido. Fracos que se oferecem para defender os fortes.

Há espaço para respirar?

Amanhã, os sapatinhos. Quando lhe tirarmos o molde do pé. Pé ("p", abre a boca, separa os lábios depressa, como num sopro rápido, "p", sente, isso, assim, "p" de pé, "p" de pessoa, "p" de pressa de sorrir quando a alma húmida da tua história contada em gestos rubros de um capuchinho e um lobo tão mau, tão mau, como as pessoas que fazem mal aos meninos, mesmo quando, apenas, se esquecem de lhes fazer bem).

"P" de percebam o decreto-lei em anexo. Percebam. Ainda há espaço para aprender.

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