quarta-feira, 12 de julho de 2006

Sonhos de piratas e piratas de sonho


Pelos vistos a primeira referência é de Homero, na Odisseia. Mais tarde, o imaginário dos homens do Norte invadindo e pilhando povoações, fazendo reféns. A História está repleta de piratas famosos, de histórias terríveis, de imaginários infantis. Heróis simpáticos portanto, porque corajosos, lutadores, com cicatrizes como crianças caídas das árvores, destemidos como todos gostaríamos de ser (ver o recente sucesso, no mundo dos adultos, do filme Os Piratas das Caraíbas e de Johny Deep no melhor da sua irreverência, romantismo e arrogância).

Edward Teach, o Barba Negra e o terror, Sir John Francis Drake, entre o amor pela raínha e a invencível armada, Henry Morgan e John Rackham, claro, de quem as lembranças de criança e crescidos são demasiado fortes, com a ajuda de Hérgé. Até Camões escreve sobre piratas. Lemos Emílio Salgari, lemos Peter Pan...

Hoje falamos de piratas do ar, quando a insegurança nos assalta em viagem, em pirataria quando os direitos de autor são violados, em rádios piratas, mais descomplexadamente quando somos nós os transgressores, usamos o termo com ternura pelos nossos próximos, travessos, invasores, terríveis de uma forma ternurenta. Dei nome de pirata ao meu filho.

Julgo o termo mais adoptado como suave que como acusador. Sempre amámos a aventura? Drake esteve em Sagres. Bandeiras ao vento, coragem no peito, armados todos em Capitães de Areia, de facto, tristes piratas de água doce, falta a aventura nas nossas vidas. Atrevemo-nos? Como gostaríamos de nos apropriar, heróis em barcos de papel, de tudo o que amamos, de seguir sem medo de lutas, para as Caraíbas, atrás dos nossos sonhos...

Pirata

Sou o único homem a bordo do meu barco.
Os outros são monstros que não falam,
Tigres e ursos que amarrei aos remos,
E o meu desprezo reina sobre o mar.
Gosto de uivar no vento com os mastros
E de me abrir na brisa com as velas,
E há momentos que são quase esquecimento
Numa doçura imensa de regresso.
A minha pátria é onde o vento passa,
A minha amada é onde os roseirais dão flor,
O meu desejo é o rastro que ficou das aves,
E nunca acordo deste sonho e nunca durmo.

Sophia de Mello Breyner

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