domingo, 24 de maio de 2009

Os nossos amigos e o tempo do hoje

Hoje tive tempo, hoje tomei o café da manhã com uma grande amiga. Programo agora a minha semana e, enquanto o tempo descansa - também o tempo descansa ao fim-de-semana - aproveito para o ludibriar e contornar, estabelecendo rotinas libertárias que me conduzirão a casa de amigos que me têm sido roubados pelo tempo de investigação e aulas e projectos. Não nos devemos deixar escravizar por nós mesmos.

Dado que os amigos são uma componente importantíssima, fundamental, da nossa identidade, e que a minha identidade é a das pessoas reais, não ficcionadas, diversas, de sorrisos diferentes e escrita múltipla, de diversos tons e projecção de voz, algumas sem voz audível, algumas com ouvido muito para lá da voz que quero dar a entender como alegre ou imune às tristezas, essa dimensão que tentamos desesperadamente esconder de quem amamos, será uma semana particularmente doce e invasiva, em que os amigos, como o melhor espelho de mim, me devolverão certamente o sorriso empenhado às rotinas impostas, nunca às escolhidas.

Penso no facebook e na preversidade das suas teias, das pessoas que têm amigos por castas ou ideologias, das pessoas que cultivam um dado conceito de amigo, o amigo igual a nós, o amigo seguro, o amigo que não nos questiona. Penso nas suas rotinas cinzentas e no seu convívio social semelhante a um soporífero forte, que não lhes permite sair de si, completar-se, voltar a si.

A nossa vida é um processo de auto-conhecimento. Onde ficaremos, quem seremos, se não nos confrontarmos com o exterior de nós, com os nossos limites? O tempo do hoje é o tempo do diferente que nos faz progredir e reencontrar. O tempo do hoje é o tempo da diversidade necessária, urgente, democrática, humana, fundamental.

quinta-feira, 21 de maio de 2009

sexta-feira, 15 de maio de 2009

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Além de um belíssimo filme e de uma viagem aos Países Baixos, este quadro faz-me pensar na necessidade que temos de silêncio quando ele é mais necessário. E no oposto.

quinta-feira, 14 de maio de 2009

Num instante

Num instante passaram 30 anos, porque há pouquinho tinha 13 e vinha de autocarro do Campo Grande com a minha amiga Teresa, que morava uns números de porta abaixo da dos meus pais. Agora a Teresa é médica e o pai dela velhinho, velhinho, arrasta-se pelas Avenidas Novas como uma multidão de velhinhos cada dia mais escassos, fora os que ficam em casa porque o frio os entristece e leva para onde não se tem nome.

Num instante deixei de me preocupar com o meu primeiro beijo e passei a pensar a cada um se seria o último, num instante passei a pensar no primeiro e no segundo e no terceiro beijos do meu filho. Num instante fiquei mãe, a mãe que foi e a que nunca será, sempre tudo para sempre.

Num instante o curso e os trabalhos na faculdade, os primeiros ordenados, a independência - achamos nós, a independência... - num instante também o outro curso e a fotografia e o mestrado em Portalegre e o E-Qual e o curso de Gestual e dar aulas e aprender Braille e mais fotografias e 25 GB de backups que fiz hoje de manhã para um disco externo (o meu primeiro disco tinha 20 Mb e duas partições). Num instante algumas viagens em que acho que o avião andou sempre no ar, Funchal, Porto Santo, São Miguel, Santa Maria, Amsterdão, Madrid, Paris, Frankfurt sempre em passagem, o Macau onde nunca fui, o Macau que sempre vi em espelho.

As músicas todas num instante, os presentes de anos, os beijos de anos, os amigos que ontem me congratularam e se congratularam comigo, os amigos velhíssimos de 30 anos e os outros, a família de toda a vida, as memórias fotográficas, as fotografias que nunca tirei, as que rasguei, a que conservo, as que desejo, as que lamento. Todos, todos: Francisco, Luísa, Inês, João, Helena, Elsa, Susana, Rui, Teresa, Carla, Carlos, Nuno, Pedro, Ana, Ricardo, Manuel, Mãe, Pai, Manos, Ana e Tiago, Sara e António, os pequeninos, sempre os pequeninos.

Um instante e Citizen Mary, blogs antes e depois e durante mas sempre Citizen Mary, a imagem da Mafalda e agora a Mary, as frases, as brincadeiras, as fases dos concursos, as fases da interacção, os comentários, agora um presente de anos, uma matrícula, Citizen Mary 66 05. Gostei.

Um matrícula quer dizer uma identidade. Com data. Com estrelas. O que serei, com 43 anos? Os livros em torno lembram-me a tese que finjo escrever, outro livro, o livro que li hoje sobre um pai com dois filhos deficientes e um humor que identifica como negro e que me parece inteligente. Um livro num saco da FNAC pela mão de amigos. Um outro livro comprado por mim, Potência de Existir, que leio aconselhada, que leio com admiração. A Mitologia que adoro e que vou ler um bocadinho todas as noites porque não é esmagadora nem europocêntrica, um outro livro muito bem concebido, muito bonito, escolhido com amizade. Gosto de livros.

Num instante e terei lido este e terei talvez 64 anos, talvez seja avó, talvez estude ainda, talvez mais pessoas da lista anterior ou eu mesma no frio e já sem estudar, a conversar no frio com os amigos que lá esperam, Nós que aqui estamos, penso no filme, penso em Évora, penso nos meus projectos e no tempo que não tenho para os fazer, penso que não mudarei o mundo como gostaria nem lhe conseguirei fugir por muito que pedale no meu triciclo há 40 anos, com três anos, a Citizen Mary que pedalava e trepava às árvores, com livros na sacola, a Mary que se espantava com o mundo, que estranhava os outros que lhe pareciam todos Aliens deformados e gigantes, o mundo agitava-se e eu não sabia, agora talvez mais parado ou fui eu que cresci e ninguém me informou.

Tenho 43 anos, um filho, uma família de parentes e amigos, uma colecção de ausências, uma colecção de desejos. Um blog para preencher. Um doutoramento para fazer. Um livro para ler. Começo: "Préface".

segunda-feira, 11 de maio de 2009

Cerca de uma segunda-feira qualquer

Choveu muito de manhã e um dos discos do meu computador desatinou. Tenho um porco e um peixe anti-stress, mas não me ajudaram muito. De qualquer forma, os textos andam trabalhados e as leituras atrasadas como manda o stress que rege as teses de ciências ocultas. Tive boas e más notícias da blogosfera, parece que o teste de matemática do meu filho correu bem, amanhã não sei como vai ser o meu dia e gostava de deixar de fumar mais uma vez, just for fun.

Há semanas que não entram na alma de ninguém.

domingo, 3 de maio de 2009

Regressos de Olivença à Rua dos Douradores

Custa o percurso, não me chegará a noite para o convencimento do madrugar nem a disciplina para cumprir tudo o aprazado para a manhã do dia que se segue a este. Da Olivença deles para a minha, amanhã talvez mais abençoada pelo anjo Gabriel das comunicações acessíveis, a coragem dispersa-se demais entre o que o foi e o que um dia será, como na lenda do Rei que jantava em camilhas com os seus amigos.

Quando nos rimos amargamente de uma chegada é sinal que os dias foram importantes. Claro que me faltam agora as estradas rápidas e a dor do trigo a passar por mim cheio de pressa, as cegonhas a negarem a pose, as andorinhas a gritar a Primavera que faltava em Lisboa e os horizontes mais largos que as fronteiras dos homens.

Levei o Tempo Perdido para reler e perdi o tempo de ler exactamente um capítulo, o que deve ser bom sinal. As memórias de Proust, construímo-las nós. Sensoriais. Fotográficas. Saboreadas como as madalenas no chá da mamã...

Porque é uma obra muitas vezes mencionada como grande e elitista, porque a considero bela e reconhecedora no homem na arte e reveladora das memórias sensoriais como as únicas afectivas, acrescento este post com uma informação adicional de quem caminhou nestes caminhos mais que eu. É bom conhecer um pouquinho melhor o que criticamos ou sobre que falamos, a fim de cumprirmos o mais sábio pedido do grande Ruben A. : "não façam a cultura chata". Ou seja, não desistam de se procurar, e apenas a vós mesmos, em tudo o que vos é dado usufruir, o que é a minha interpretação absolutamente sensorial, ilógica, emocional, curiosa, procurante... (08:50 de 4 de Maio)